Miss Marple: Helen Hayes, Joan Hickson, Julia Mckenzie
Muitos criticam a postura conservadora e, por vezes, até mesmo preconceituosa demonstrada pela escritora inglesa Agatha Christie em sua obra. Para essas pessoas, o romance policial Um Passe de Mágica [They Do It With Mirrors] deve ser um exemplo perfeito e conjugado do tradicionalismo e da intolerância contra estrangeiros praticados pela autora.
Quanto ao tradicionalismo, não há muito o que argumentar. Na trama do livro, a escritora põe em dúvida a eficácia da abordagem humanista dos métodos de recuperação de delinquentes juvenis praticados na instituição Stonygates, de Lewis e Carrie-Louise Serrocold, uma velha amiga de Miss Marple da época em que eram jovens em turnê pela Itália junto com a irmã de Carrie-Louise, Ruth. As três fizeram o Grand Tour juntas.
Miss Marple critica os métodos de Stonygates e, mais ainda, a condescendência que considerava excessiva na disciplina de jovens infratores, preferindo que a filantropia se dedicasse aos jovens que, passando pelos mesmos problemas, não caíam no crime. Tanto ela quanto Ruth demonstram ter uma visão menos idealista da vida.
As palavras de Mrs. Van Rydock vieram a propósito.
– Carrie Louise sempre viveu completamente fora da realidade – disse. – Não conhece nada do mundo. Talvez seja isso que me preocupe.
– Quem sabe o meio – começou Miss Marple, mas parou logo, sacudindo cabeça. – Não – disse.
– Não, é ela mesma – afirmou Ruth Van Rydock. De nós duas, Carrie Louise sempre foi a que tinha ideais. Lógico que quando éramos moças isso estava na moda – todo mundo tinha ideais, ficava bem ter. Você queria cuidar de leprosos, Jane, e eu ia ser freira. A gente se cura dessas tolices. [Agatha Christie, Um Passe de Mágica, trad. Milton Persson. L&PM Editores, 2006]
Já sobre a intolerância, de fato há menções pouco honrosas contra personagens norte-americanos, italianos e russos, porém a maior parte – se não a totalidade – dos comentários preconceituosos é dita por uma personagem de mentalidade estreita, rancorosa e amargurada, o que retira muito da sua credibilidade.
O próprio talho rígido dos lábios possuía um ascético ar eclesiástico. Personificava a Paciência Cristã e, possivelmente, a Retitude Moral. Mas não, segundo Curry, a Caridade. [idem]
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